domingo, 31 de outubro de 2010

Deixa eu te CANTAR uma história...



O que todos conhecem como “samba-enredo” é uma evolução do samba, um sub-gênero, que nada mais é do que um samba feito em cima de um enredo (tema). As escolas de samba escolhem o tema que apresentarão no carnaval, e seus compositores compõem sambas contando aquela história. Simples na concepção, mas todo o processo que envolve uma escolha de samba-enredo é bem complexa, passa por uma série de eliminatórias, e culmina finalmente com a escolha do samba que mais tarde, será conhecido da grande massa que acompanha os desfiles.
E como tudo invarialmente tem seu início, com os sambas-enredo não seria diferente e, claro, tem que passar pela Mangueira, a ESTAÇÃO PRIMEIRA DO SAMBA.
Sempre haverá quem discorde, evidente, até porque muito do que se sabe dos carnavais antigos, é baseado em histórias que foram passando boca a boca, e nem sempre pesquisadores e historiadores do tema são unânimes ao afirmar coisas sobre o assunto.

O fato é que o samba “Homenagem”, que data de 1933, embalou o desfile da Estação Primeira de Mangueira, cujo enredo era “Uma 2ª feira do Senhor do Bonfim” e tomando por parâmetro a idéia de que um samba-enredo tem como principal característica abordar um determinado tema, esse samba foi o primeiro, ou um dos primeiros de que se tenha registro, a abordar algum tema específico. Claro que um samba-enredo não tem como base apenas o fato de contar uma história, ele tem também características melódicas próprias, que o diferenciam de outros sambas.
Ao falar de samba-enredo, é impossível não citar, por exemplo, os famosos “É hoje” (regravado por Caetano Veloso), “O amanhã” (imortalizado na voz de Simone), “Yayá do Cais Dourado” (Martinho da Vila), os dois primeiros da União da Ilha e o último da Vila Isabel. Nasceram sambas-enredo, e tornaram-se classicos da Música Popular Brasileira.

O que pouca gente sabe é que alem desses, outros sambas-enredo, que habitaram a pré-história do gênero, vieram a tornar-se grandes canções da MPB.
Um deles em especial, leva a chancela verde e rosa, e fez um estrondoso sucesso na década de 70, nas vozes de Paulinho da Viola e Cartola! Se eu disser “O destino não quiz”, quase ninguém saberá de que música estou falando. Se eu mencionar “Não quero mais”, alguns mais saudosistas saberão que estou me referindo a uma canção que fez sucesso no final da década de 40, na voz de Aracy de Almeida. Mas se eu mencionar “Não quero mais amar a ninguém”, aí sim, muitos lembrarão desse belo samba! O que poucos sabem, é que todos os títulos citados, referem-se à mesma canção, de autoria de Cartola e Carlos Cachaça, adaptado posteriormente por Zé com Fome, e que embalou o desfile vice-campeão da verde e rosa no longínquo carnaval de 1936! Um samba que atravessou o tempo, e quase 40 anos depois, ressurgiu para ser imortalizado pela dupla que encantou o mundo da música na década de 70!




”Não quero mais amar a ninguém
Não fui feliz
O destino não quis
O meu primeiro amor
Morreu como a flor
Ainda em botão
Deixando os espinhos
Que dilaceram meu coração
Semente de amor
Sei que sou desde nascença
Mas sem ter vida e fulgor
Eis a minha sentença
Tentei pela primeira vez
Esse sonho vibrar
Foi beijo que nasceu e morreu
Sem se chegar a dar
Às vezes dou gargalhada
Ao lembrar o meu passado
Nunca pensei em amor
Não amei nem fui amado
Se julgas que estou mentindo
Jurar sou capaz
Foi um simples sonho que passou
E nada mais”


http://www.4shared.com/audio/7gMhBb2t/05-No_Quero_Mais_Amar_a_Ningum.htm

(áudio com Beth Carvalho)

Aliás, os sambas-enredo são muito mais do que simples canções que servem para emoldurar ou ilustrar um desfile de carnaval. Através deles, ficamos conhecendo um pouco mais da história, um pouco mais de alguns personagens, ou ainda, dão voz a criticas sociais, questionamentos, e grandes reflexões políticas. Mas isso é assunto para um próximo texto!
Pesquista de texto:
"CliqueMusic" (Tárik de Souza para a coluna do UOL)
“Samba de Enredo - História e Arte", de Alberto Mussa e Luiz Antonio Simas - Editora Civilização Brasileira

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

VERSOS MODESTOS

CONCURSO LITERÁRIO “SEMPRE MANGUEIRA”




No carnaval de 2011, a Estação Primeira de Mangueira levará para a avenida o enredo “O Filho Fiel, Sempre Mangueira”, homenagem ao centenário do bamba Nelson Cavaquinho, que imortalizou em suas obras, seu amor incondicional pela verde e rosa, e , compôs, dentre outras, a famosa “Folhas Secas”.
Assim como vários poetas, que imortalizaram seus versos cantando Mangueira, você também poderá expressar seu talento!

“Sempre Mangueira” – A ação cultural que vai premiar os melhores textos que exaltem esse verdadeiro celeiro de bambas, de onde sairam versos que encantam o mundo inteiro!

Sempre Mangueira
(Nelson Cavaquinho e Geraldo Queiroz)

Mangueira é celeiro
De bambas como eu
Portela também teve
O Paulo que morreu
Mas o sambista vive eternamente
No coração da gente
Mas o sambista vive eternamente
No coração da gente
Os versos de Mangueira são modestos
Mas há sempre força de expressão
Nossos barracos são castelos
Em nossa imaginação
Ôh, ôh, ôh, ôh!
Foi Mangueira quem chegou
Ôh, ôh, ôh, ôh!
Foi Mangueira quem chegou


Faça como Nelson Cavaquinho! Faça seus “versos modestos” e participe desse concurso.

E se você quiser saber mais sobre a Mangueira, sua história, e seu carnaval, acesse o site oficial da escola.

www.mangueira.com.br/mangueira



Acesse também o site da 1ª torcida organizada oficial da Mangueira, a “Nação Verde e Rosa”


www.nacaoverdeerosa.com.br


Ou se preferir, entre na comunidade oficial da Estação Primeira de Mangueira no Orkut!

http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=93274169



Idealização: Luzinete Lima (Tia Lu) – Diretora Cultura da Mangueira com a colaboração de Sandro Batista, Isis Barros, Antonio Lourençato, Carlos Oliveira (Mumu), Léo Rangel, Rafa Sampaio e Alexandre Assed

Regras e condições de participação no link:
http://www.nacaoverdeerosa.com.br/regulamento-do-concurso-literario-qsempre-mangueiraq.html



*este concurso não tem vínculo com a instituição Estação Primeira de Mangueira, é uma iniciativa sem fins lucrativos, e a premiação será em livros, gentilmente cedidos por Luzinete Lima.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Daltonismo


"O samba Alvorada foi feito em uma madrugada quando eu e Cartola descíamos o morro do Pindura Saia".
(Carlos Cachaça na última faixa de sua única obra discográfica)

Impossível não evidenciar que a relação samba-morro é ao mesmo tempo estreita e controversa. O samba, que desde sua origem é marginalizado, seguiu com suas origens na direção dos morros cariocas. A discriminação implícita nas pessoas, acabou por fazer do samba, a voz do morro, dos excluídos. Ocorre, que de forma controversa, esse mesmo ritmo marginalizado, é o que melhor exemplifica a cultura brasileira.
Partindo do suposto de que o samba passou a ser a voz do morro, temos diversas vertentes a serem abordadas.
Uma delas, e a mais bela e admirada , é a visão poética! Nessa abordagem, as mazelas e dificuldades são simplesmente omitidas. Não que haja má fé, mas, os poetas sambistas, em vários momentos, lançaram olhares poéticos sobre a rudeza da vida segregada da favela, e nos presentearam com suas principais obras do gênero.
“Alvorada”, o clássico de autoria de Cartola e Carlos Cachaça, surgiu, segundo Carlos Cachaça, numa madrugada em que ambos desciam o morro do Pindura Saia. A visão da natureza, a embriaguez de beleza, os fez lançar um olhar totalmente poético sobre o Morro da Mangueira. Não acredito ter sido uma tentativa de esconder os problemas de toda comunidade carente, mas sim uma forma de mostrar que o morro, não é feito apenas de mazelas. Uma forma de mostrar que existe beleza, e que os dias no morro, nascem como nascem em qualquer lugar. O morro deixa de ser sombrio, e explode em beleza. E quem sabe não quiseram os autores despertar a esperança, e mostrar que a vida floresce no morro, resistindo bravamente às dificuldades.
“Alvorada lá no morro, que beleza,
Ninguém chora, não há tristeza
Ninguém sente dissabor
O sol colorindo é tão lindo, é tão lindo
E a natureza sorrindo, tingindo, tingindo
( a alvorada )....”

Existe também o samba como forma de expressão e rebeldia. Uma forma de chamar atenção para as mazelas, para o abandono, e até quem sabe, um grito de socorro. Hoje, é comum vermos nos noticiários cenas de horror nos morros cariocas, mas isso, toda essa difusão de informações, dá-nos a falsa sensação de que a vida no morro, de uma hora pra outra, tornou-se um caos. Engana-se quem pensa assim. Todo processo tem um começo, e não existem fenômenos. O que acontece hoje, é fruto de um processo longo, de anos, que talvez tenha apenas se agravado em face da própria evolução da sociedade, cada vez mais desinteressada, ou conformada. Muitos sambas serviram como pedido de socorro, grito de alerta, e mostraram o lado não tão poético das favelas.
Zé Ketti, em 1965, já denunciava o descaso das autoridades, o abandono da sociedade, e na canção “Acender as Velas” já dizia o que hoje, mais de 40 anos depois, vemos nos noticiários.



“Acender as velas
Já é profissão
Quando não tem samba
Tem desilusão
É mais um coração
Que deixa de bater
Um anjo vai pro céu
Deus me perdoe
Mas vou dizer
O doutor chegou tarde demais
Porque no morro
Não tem automóvel pra subir
Não tem telefone pra chamar
E não tem beleza pra se ver
E a gente morre sem querer morrer”


Em ambos os casos, fica evidente que o sambista do morro teve sensibilidade para ver beleza onde para os olhos preconceituosos da sociedade, só existe miséria e dor. E teve coragem, para mostras àqueles que se conformaram com a miséria e a dor, que a marginalização do morro é um problema comum, e não isolado. O samba, sem sombra de dúvida, é uma voz que não cala. E se de um lado, ele nos conforta, e nos faz sonhar que belas imagens, de outro, ele nos traz à realidade que não queremos enxergar. O samba é a flor que nasceu na terra árida, esquecida, mas que foi regada com sentimento, com orgulho, com engajamento. O samba que vem do morro é a prova de que existe esperança, existe uma gente que não pode , nem nunca será esquecida. Porque o samba jamais vai se calar! Ele sempre estará a nos lembrar que aquela gente esquecida, está cada vez mais presente em nossa vida. De alguma forma, o samba nos chama para a realidade poética, ou para a poesia insossa chamada favela!


Fontes de Pesquisa:
http://www.jblog.com.br/hojenahistoria.php?itemid=3995

“Artigo: As múltiplas representações da ‘favela’ no universo das letras de samba” - André Pelliccione ( Jornalista e Mestre em Ciência Política pela UFRJ). Para o SINDSPREV on line.
Créditos da segunda foto: Claudia Ferreira

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

O famoso Agenor


Além do nome de batismo, ambos tinham em comum o talento nato para a poesia.
Quando lembramos de ambos, invariavelmente nos referimos a eles como poetas. Transcenderam, cada qual ao seu modo, a linha imaginária que separa o comum do genial.
E também, em comum, tinham a visão privilegiada da dor. Poucos conseguem ver beleza na dor, e expressá-la de forma sublime, e ao mesmo tempo tão verdadeira.
Ambos somente tiveram a consagração quando parecia já ser tarde. Mas para a eternidade, nunca é tarde!
Cazuza e Cartola, que foram unidos apenas na emoção, sem talvez nunca ter um esbarrado no outro, tinham um elo muito maior que a relação fã – ídolo.
Cartola era o ídolo de Cazuza, e ao seu modo, foi o Cartola do Rock. E não seria nenhuma heresia afirmar que Cartola fora o Cazuza do samba.
Cazuza levava para o rock todo o sentimento típico dos sambistas, e Cartola imprimiu em muitas de suas obras, toda a rebeldia e afirmação típicas do rock. Cada um no seu tempo, juntos por todo o tempo, por terem sido poetas!



Cazuza, o “exagerado” não foi um rockeiro comum. O que fazia dele alguém incomum, era , expressar em poesia, suas dores , dissabores, angústias. Ele dissecava os sentimentos mais comuns com tamanha beleza e poesia, que seus versos até hoje ecoam pelos quatro cantos desse País. O que Cazuza tem a ver com samba? Tudo! Desde a coincidência com seu homônimo, o que aliás o encorajou a assumir o nome de batismo ainda na juventude (sim, Cazuza somente foi convencido a aceitar o nome “Agenor”, ao ouvir de sua mãe, que era o mesmo nome de seu ídolo, Cartola).
Até a alma, típica de sambista , que mistura sentimentos, nostalgia, sinceridade. Cazuza muito mais do que usar o rock como voz para protestar, usou o rock para dizer que existia dentro de cada um de nós, uma pessoa comum. Cazuza, usando da rebeldia que era típica de sua geração, protestou contra tudo e contra todos, e talvez, até mesmo como uma espécie de auto-crítica ao modismo que teimava em esconder fraquezas atrás de uma força imaginária que cada um tem dentro de si, fez da “dor de cotovelo” uma de suas maiores bandeiras. Cazuza tinha um sambista dentro de si...

E não sou em quem estou dizendo...
Isso, foi ele, o próprio Cazuza, quem falou:

“Eu sou letrista de rock, por acaso. Se houvesse pintado um grupo de samba, em vez do Barão Vermelho, eu estaria compondo sambas. De qualquer forma, sou muito latino, muito passional, e minha poesia reflete isso. Posso tentar caminhar no estilo Joy Division, mas quando vou ver o resultado, está muito Cartola.”

“Cartola não existiu, Foi um sonho que a gente teve!”

“Acho até que, atualmente, poucos compositores falam da dor. Antigamente tinha aos montes: Dolores Duran, Lupicinio Rodrigues, Noel Rosa, Cartola, Maysa e tantos outros”

Raridade! No especial, "Chico & Caetano", da Rede Globo, em 1985, Cazuza interpreta "Luz Negra", de Nelson Cavaquinho.

Se alguém tem dúvida de que Cazuza tinha um sambista dentro de si, vale uma olhada para tirar sua conclusões!


http://www.youtube.com/watch?v=z_hdQnvDHQY

Fonte de Pesquisa: "Cazuza - Só as Mães São Felizes" - Lucinha Araújo (depoimento à Regina Echeverria) - Editora Globo