segunda-feira, 18 de abril de 2011

"Ninguém vai calar"

O carnaval carioca há muito tempo deixou de ser aquela festa cheia de romantismo e entusiasmo. Desde os grandes bailes à fantasia em clubes e sociedades famosos, que passaram a ser o baile “de fantasias” (sexuais), aos tradicionais blocos de rua, que deixaram de ser o encontro dos jovens revolucionários, para ser o encontro dos jovens ávidos por bebida e beijos em bocas pra lá de beijadas. A revolução democrática que tirou o Brasil da ditadura, fez com que o carnaval perdesse bastante de sua essência. Restou apenas o espetáculo das escolas de samba, cada fez mais pasteurizado e hollywoodiano, regado a muito luxo, brilho e efeitos especiais, para um público cada vez mais preocupado com a estética e menos preocupado com o samba, e talvez por isso, aumente a dimensão do carnaval de Salvador, que na verdade é uma festa de rua, embalada por trios elétricos também cada vez mais cheios de efeitos, e por artistas cada vez mais estelares, preços cada vez menos populares e, dizem, um festival de violência gratuita à céu aberto. Tudo isso é o reflexo da sociedade atual, artificializada pelo que dita a mídia. Me perdoem a franqueza, mas vivemos tempos fúteis, onde conteúdo cultural e essência carnavalesca é o que menos importa. O que importa mesmo é ficar bonito no retrato, em poses mega “da hora” para estampar o “face” e o Orkut, e quanto mais famoso for o cenário, mais descolado é o perfil de quem posa. Absolutamente, não estou dizendo que isso não seja divertido, e nem tampouco que isso não seja carnaval. Mas vamos combinar que o carnaval já não é mais como antigamente, e para muitos, só resta mesmo recorrer ao Youtube para conhecer a grandeza dessa festa que já foi um dia o maior espetáculo da Terra. FOI! Não é mais! É cada vez maior o desinteresse pelos desfiles cariocas e já esse ano, vimos o IBOPE dos desfiles de São Paulo ultrapassar os do Rio, algo até bem pouco tempo inimaginável.

Todos tem lá sua parcela de culpa. O público, cada vez mais ansioso por efeitos especiais, a televisão, cada vez mais engessando o espetáculo em nome de sua grade e de seus patrocinadores, e as escolas, cada vez mais escravas dos patrocínios e cada vez mais distante de suas raízes, desfilando temas cada vez menos irrelevantes e cada vez menos preocupadas com o carnaval e sim com a fria técnica que , dizem, é o que determina quem é a melhor ou não.

Mas existe quem resista a tudo isso. Prestes a completar 83 anos de uma gloriosa e indiscutível história, a Mangueira desponta talvez como um símbolo da resistência. Justamente num momento em que todas as flechas apontam para temas cada vez mais disfarçados de cultura, porque na verdade o que conta é quanto cada enredo poderá render à escola, a verde rosa do Morro da Mangueira vai na direção contrária. Essa história de escola falida, que não atrai investidores, é conversa fiada de quem não entende absolutamente nada nem de carnaval, nem tem o mínimo de senso óbvio de perceber que Mangueira é uma marca sólida dentro do universo carnavalesco, portanto, qualquer patrocinador que esteja de fato antenado e que queria fazer sua marca ter uma grande projeção, com certeza gostaria de ter seu nome associado à escola, pelo simples fato de que é ela, sem dúvida alguma, a mais popular dentre todas. Não há nessa afirmação nenhuma ponta de soberba, ou desrespeito às demais agremiações, mas vamos combinar que não é todo dia que nasce um Cartola, e mais ainda, que esse mesmo cidadão, juntamente com outros tantos (talvez não tão sortudos diante da história) fundam uma escola de samba, escolhe a inusitada combinação de verde e rosa para ser suas cores, e atraí para o berço dela, os maiores nomes da música popular brasileira, que já cantaram em todas as formas e ritmos, a grandiosidade dessa que é sinônimo de raiz. A Mangueira é orgulhosa sim, e estampa seu orgulho sempre, seja nas letras de seus sambas, que sempre tem um espaço para uma exaltação a si, seja no sorriso de sua gente, que a cada ano, pisa a Sapucaí com um país inteiro à sua espera. É impressionante o que a Estação Primeira de Mangueira causa nas pessoas, sejam elas torcedoras , simpatizantes ou não.

Em 2012 não será diferente. A Mangueira, do alto de sua importância para o carnaval e para a cultura do nosso País, foi buscar no Cacique de Ramos, um símbolo da resistência carnavalesca, a inspiração para seu desfile. Mesmo correndo o risco de ser taxado de soberbo, ouso afirmar que poucas escolas, ou talvez nenhuma, tivesse a ousadia de ir buscar na história desse bloco inspiração para mostrar seu carnaval, abrindo mão de patrocínios, e de tantas outras coisa. Talvez seja esse o papel da Mangueira, o de fazer essa revolução silenciosa. E quando todas as outras vão buscar coisas mirabolantes para mostrarem na avenida, a verde e rosa vai buscar o que há de mais puro e simples. Vai levar pra avenida a história de um bloco que revolucionou uma época, o retrato de um povo que não se rende jamais, que está sempre pronto a soltar sua voz contra aquilo que não lhe agrada. A Mangueira tem esse dom, de ser a voz que não cala, que grita bem alto, que o samba e o povo é sua mais alta bandeira. E quando acaba o carnaval, a Mangueira deixa pra trás muito mais que imagens de um desfile, deixa a certeza de que enquanto ela existir, haverá espaço para o que há de mais importante na festa dita do povo: a satisfação dessa gente, em se ver ali, desfilando na passarela. Porque de todos os dons que a Mangueira tem, o mais grandioso é sem dúvida alguma, mostrar às pessoas a história delas próprias.

“Sou a cara do povo, Mangueira,

Eterna paixão!

A voz do samba, é verde e rosa

E nem cabe explicação”

30 comentários:

  1. nossa este texto veio na hora certa pra mim.
    Eu estava mesmo querendo ler alguma reflexão crítica sobre a tal raiz do samba(no carnaval),e foi bom ler isso.
    Eu estava na bahia com um grupo de amigos( antes do carnaval) e enquanto andamos na rua ,em uma casa um grupo estava ensaiando as marchinhas ,nois entramos lá e ficamos dançando.Foi a 1º vez q ouvi assim de perto.
    Eu acho que tudo que tem a essência boa não se deve perder pra esse nosso mundo espetaculoso e fútil.
    Parabéns pelo texto e não pare nunca,pois,eu ainda quero ver a essência deste carnaval ai (o carioca)esse ainda não vi pessoalmente =)

    http://algopoetico.blogspot.com/

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  2. krak
    mt bommm
    carnaval, melhor epoca do ano.
    sdds do de 2011,que venha o de 2012
    parabens pelo blog
    espero sua visita

    www.nos4.wordpress.com
    /seu blog diário...

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  3. Mais um texto profundo e com propriedade. Não sou um amante do samba, mas admiro teu trabalho e paixão por esse ritmo. Fazia tempo que não comentava por aqui.

    Agora meu blog virou site, mas o conteúdo continua o mesmo. Abração pra ti e parabéns pelo blog.

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  4. Texto ótimo de ler! É muito bom poder ver a Mangueira desempenhando um papel de destaque no incentivo à nossa cultura. Beleza, Sandro!

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  5. É sempre um grande prazer passar por aqui. Sobre a primeira parte do texto, posso dizer e ilustrar as suas palavras com aquele samba famoso da São Clemente: "o mestre-sala foi parar em outra escola, amparados por cartolas no poder de quem dá mais, e o puxador vendeu seu passe novamente, quem diria minha gente, olha o que o dinheiro faz...". Isso resume bem a conjuntura atual, e a crítica já vinha sido feita desde os anos 90.

    Sobre a grande Mangueira, há tempos a escola vem cantando a música ou seus bambas: Caymmi (86), Caetano, Gil e toda a Bahia (94), Chico (98), a própria música ano passado, Nelson Cavaquinho esse ano, se não me perdi nesse interím! Acredito e admiro muito esses enredos e gosto muito mais destes do que aqueles enredos sobre determinados lugares ou fazendo alusões a marcas, como aquela história de camarote número 1.

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  6. O carnaval do Rio de 2011 foi bom e esperamos que em 2012 seja melhor ainda. =)

    http://boomnaweb.blogspot.com/

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  7. Não deixe o samba morrer! Carnaval é patrimônio nacional e deve ser tratado com carinho!

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  8. Vivemos num mundo tão automatizado e imediatista,que na maioria das vezes,as pessoas nem sabe o que estão fazendo...Por isso,que reflexões como a sua são tão importantes,pois resgatam quem ainda tem sensibilidade!
    E a essência do que é verdadeiro,perdura sim,vide a Mangueira ^^
    bjssss :)

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  9. O legal de seu blog é que é Carnaval o ano inteiro. Concordo com você sobre essa tendência das pessoas não quererem pensar, trabalhar, caprichar. Nada adianta uma embalagem linda de o chocolate é pobre. E nós que gostamos de conteúdo e beleza sem exageiros sofremos com uma galera que faz crítica ao dizer que o trabalho bem feito é coisa de velho. Acho sim que Carnaval deve ser acima de tudo Cultura e não produto de pacote turístico. Carnaval tem que ter história, tem que darnos aquela atmosfera que temos quando nos referimos por exemplo as cidades de Minas tais como Mariana, Diamantina... aqui em Minas a UFMG e a Rede Minas de Tv trabalham muito essa magia da cultura e essa vontade de se conhecer as nossas origens. É bom, nos faz sentir bem por dentro. Menos pobres! ;D

    Parabéns! Adoro seu blog! Ele é cultura também! =)

    Abraços!

    http://neowellblog.wordpress.com/

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  10. Falou e disse meu caro. O carnaval perdeu a sua essência, e são os bravos aqueles que resistem. A mangueira está de parabéns por continuar lutando. Todos contra o materialismo.

    http://ozeladorfiel.blogspot.com

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  11. Bela reflexão sobre a indústria do samba nascida dentro da industria cultural brasileira

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  12. verdade mesmo, infelizmente o carnaval perdeu sua essencia de diversão e brincadeira... hj é mais comercial além de toda a sacanagem por trás... Sempre simpatizei com a mangueira, acho que é uma escola lutadora, bem parecida com o povo brasileiro,

    Abraço

    http://cacadores-de-deus.blogspot.com/

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  13. Sinceramente, não sou fã de carnaval. Acho desnecessário tanta apelação.
    http://prontaparacrescer.co.cc

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  14. Como de costume, estive no Bola Preta este ano e o que vi - ou não vi - foi pouca roupa e muita bebida. Quase ninguém cantava as marchinhas, no máximo, os sambas de enredo mais populares. A festa da carne nunca fez tão jus ao seu nome!

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  15. Realmente tudo se tornou tão fútil que chega a dar nojo. Mas ainda bem que ainda há os que lutam pela cultura brasileira, um trabalho de se admirar em uma época que o capital se sobressai a cultura.

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  16. Muito linda a forma como fala da Mangueira. Sá para sentir tua paixão pela Escola e pelo samba. Lendo o texto, senti vontade de conhecer o carnaval que já não existe mais. Suas críticas são realistas e muito bem embasadas. Adorei o termo "hollywoodiano" para o carnaval de hoje em dia. Tudo esta virando produto.

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  17. Olá. Acho que você pulou sem querer o meu Blog, em uma daquelas comunidades sobre Blog no Orkut. Me deve um comentário.

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  18. é chato saber que a verdadeira essência do carnaval se perdeu, mas que bom q ainda existem quem lutem por ela...

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  19. Não curto muito o carnaval, mas seu texto ficou ótimo!

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  20. Ao contrário do autor eu acho que a congregação de "jovens revolucionários" era bastante contrária a essência do carnaval que sempre foi a expressão das paixões desmedidas e a celebração da carne para acalmar os espíritos diante da quaresma que se aproxima.

    O resto é crítica de caráter esquerdista que não me anima muito a comentar.

    Em comum temos o amor ao samba.

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  21. Concordo com o post, porem nao vamos esquecer que hoje em dia até o enredo é patrocinado, o que tira mta da essencia do proprio samba...


    Se puder entrar no meu blog, agradeceria mto
    http://briefmarketing.blogspot.com

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  22. bom seu blog cara, tem praticamente tudo sobre samba rs

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  23. Não sou chegado a carnaval, mas respeito muito a Mangueira!

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  24. "Antenado disse: Não sou chegado a carnaval, mas respeito muito a Mangueira!"
    ri alto huahahuahuahha

    Confesso que também não sou muito fã do carnaval, mas dou maior aos desfiles das escolas de samba. ;D

    Abraço.

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  25. Eu nunca gostei de carnaval, de multidão, dessas musicas, sou nerd demais pra isso rs ;)

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  26. Recentemente, aqui em Fortaleza, estamos passando por uma espécie de resgate as festas, bailes e desfiles de rua das décadas de 50, 60 e 70, no entanto, nossa ressurreição já começou doente. Os recém-nascidos já dão sinais de que conquistar o troféu é o mais importante, os patrocinadores e os grandes nomes ditam mais a cada ano e as mulheres semi-nuas já são o toque especial de alguns eventos.

    O romantismo e o entusiasmo no Carnaval deixou de existir não só no Rio, mas em todo o país.

    Ahh! Não te achei soberbo, mas um apaixonado pela Mangueira!!!

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  27. Não gosto muito de carnaval, de todos as fantasias, dos desfiles, sou mais de sair na rua, com os amigos, conhecer pessoas, zoar e tudo mais.. Mas posso concordar que o carnaval hoje em dia não é como antes!

    http://viciadasemake.blogspot.com/

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